Embora o enorme esforço verbal para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e direcionar as ações para práticas sustentáveis, os discursos são só isso: esforço verbal que prevalece às ações reais.
Um dos maiores desafios do Brasil é a gestão dos resíduos urbanos em cidades cada vez mais populosas. Como cada brasileiro produz em média 0,5 kg de resíduos orgânicos por dia, é exatamente aí que há uma solução concreta, eficaz e definitiva para a produção de energia limpa e renovável: a biodigestão anaeróbia. Essa técnica transforma a matéria orgânica em biogás, que pode ser convertido em energia elétrica e combustível. Em acréscimo, também é preciso considerar o potencial dos resíduos da agropecuária (dejetos da criação animal, bagaços etc) como fonte excelente de biogás.
É preciso, portanto, e ainda não é tarde, elevar o biogás e a biodigestão anaeróbia à condição de protagonistas do combate aos efeitos das alterações climáticas. O ganho será em muitas direções: redução dos gastos com saúde, cidades mais limpas, redução de 50% do “plantio” de lixo e produção de energia, de fato, limpa e renovável. Investir nesse caminho não apenas promove a sustentabilidade ambiental, mas é oportunidade lucrativa e economicamente viável.
O que se observa, porém, é que é sempre mais fácil adotar soluções convencionais, mesmo que resultem em desequilíbrios e malefícios, bastando conferir à “solução” um rótulo moderno, tipo verde ou limpo, para que seja aceito e adotado. Basta não derivar do petróleo. Ignora-se muitas vezes os impactos negativos irreversíveis que a “solução” traz consigoi. A energia eólica, por exemplo, é frequentemente exaltada como limpa, apesar dos efeitos devastadores na paisagem, nos ecossistemas e na vida das pessoas que sempre viveram no entorno de onde são instalados parques eólicos. Uma solução sustentável precisa atender aos aspectos econômico, social, e ambiental
O mesmo padrão se repete com a “solução” hidrelétrica, que, longe de ser, de fato, limpa, impõe o desaparecimento de cidades, a mudança nos cursos dos rios e os prejuízos aos ecossistemas locais. Belo Monte que o diga. Enquanto isso, o lixo se acumulou nos lixões a céu aberto.
Para uma ideia aproximada do potencial do biogás (metano e dióxido de carbono) como fonte de energia limpa, 1 tonelada da fração orgânica dos resíduos sólidos produz, considerando a média de 60% de metano no biogás, 73,800m3 desse gás e a queima de 1m³ dele libera algo em torno de 1,8 kWhel (quilowatt-hora elétrico), o que não é pouco. É verdade que há outros números, mas que se referem à Europa e são descolados da realidade brasileira.
Segundo a ABIOGAS, o potencial de produção de biogás no Brasil, estimado de modo conservador, é de, aproximadamente, 23 bilhões de m³/ano. Basta fazer a conta para saber o potencial de conversão em energia elétrica. Atende plenamente às necessidades nacionais? Possível que não. Mas há que se valorizar o que se alinha com o discurso. Ou se muda o discurso e continua se queimando diesel como nem muitas termelétricas em operação.
Diante do exposto, é inegável a urgência de priorizar os esforços para alternativas verdadeiramente limpas sustentáveis para o Brasil e para o mundo. Portanto, em substituição aos adjetivos com que tentam colorir e validar práticas equivocadas nos aspectos ambiental, social e econômico, o que se propõe é concentrar os esforços na multiplicação de biodigestores, fazendo do biogás e da digestão anaeróbia em reatores os protagonistas, também, da mudança nas matrizes elétrica e energética brasileira.
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