BIODIGESTOR NÃO É SAPATO

Biodigestor é só o nome genérico de uma câmara anaeróbia destinada à decomposição de matéria orgânica, em que resultarão biogás e o biofertilizante. Biodigestores encerram tecnologias distintas que precisam ser bem consideradas quando se pretende investir. Diferente de um sapato na prateleira, que se escolhe pela cor ou pelo modelo, biodigestores comerciais não existem antes da verificação de alguns parâmetros, como se verá.

A implementação bem-sucedida de um sistema de biodigestão exige abordagem abrangente e multidisciplinar que leve em consideração fatores técnicos, econômico-financeiros e regulatórios. Mesmo que realize a análise detalhada do substrato disponível, dimensione o biodigestor de acordo com a quantidade, que considere o uso pretendido para o biogás que será produzido e avalie os custos e benefícios associados ao projeto, a empresa interessada pode garantir que está adotando a melhor rota tecnológica para maximizar os benefícios ambientais e econômicos do sistema de biodigestão pretendido? Simplesmente recorrendo ao mercado, sem o estudo detalhado feito por especialistas, corre o risco de ficar limitada às tecnologias oferecidas pelo integrador escolhido, muitas vezes, pelo menor preço, sem garantia de que serão as mais eficientes ou adequadas para necessidades específicas que se pretende atender. Portanto, é fundamental buscar a orientação de consultores especializados em biogás para garantir o sucesso do projeto e maximizar o retorno sobre o investimento.

Um dos primeiros passos críticos para quem pretende implantar um sistema de biodigestão anaeróbia em biodigestores de grande porte é a análise do substrato disponível. Os substratos, que são a matéria orgânica que será convertida em biogás durante o processo, podem variar significativamente em termos de composição, características físicas e quantidade. Resíduos agrícolas, como restos de colheitas e esterco animal, resíduos de alimentos, lodo de esgoto e resíduos de processos industriais são apenas exemplos do que pode ser utilizado.

Cada tipo de substrato possui características próprias que afetam diretamente o desempenho e a eficiência do biodigestor. Por exemplo, substratos excessivamente fibrosos podem exigir tempo de retenção mais longo e temperatura de operação mais alta para garantir uma digestão completa com produção de biogás adequada. Além disso, a composição química dos substratos também pode influenciar a qualidade do biogás produzido (com maior ou menor teor de metano), e a quantidade.

Uma vez que o substrato tenha sido caracterizado, o próximo passo é determinar o tipo de biodigestor a utilizar (BLC, UASB, CSTR et cetera), bem como a disponibilidade de substratos adicionais que podem ser adquiridos de outras fontes.

É essencial dimensionar o biodigestor de acordo com a quantidade regular de substrato disponível para garantir o desempenho eficiente e evitar problemas de sobrecarga ou subutilização.

Também é importante considerar o uso pretendido para o biogás produzido no biodigestor. O biogás pode ser utilizado de várias maneiras: geração de eletricidade, aquecimento, cogeração de calor e eletricidade, ou combustível para veículos, o biometano. Cada aplicação requer considerações específicas em termos de qualidade e composição do biogás, bem como tecnologias adicionais de filtragem e armazenamento, se necessário. Se o biogás for utilizado para geração de eletricidade, será necessário instalar, por exemplo, um sistema para remover impurezas como o sulfeto de hidrogênio, gás altamente corrosivo que pode danificar os geradores, principalmente.

Além dos aspectos técnicos, é importante ainda considerar os aspectos econômicos e regulatórios ao se pensar num sistema de biodigestão. Os custos de capital e operacionais associados à planta devem ser cuidadosamente avaliados em relação aos benefícios esperados, incluindo economias de custos com eliminação de resíduos, redução de emissões de gases de efeito estufa e potenciais receitas geradas pela venda de energia ou créditos de carbono. Também é essencial garantir que o projeto esteja em conformidade com as regulamentações ambientais, de saúde e segurança, o que pode exigir a obtenção de licenças e autorizações específicas das autoridades locais.

E para concluir, é necessário, por óbvio, verificar a disponibilidade de área para instalação da planta.

Percebe-se, pois, que um biodigestor de grande porte não é um produto pronto que se pega na prateleira; para existir, exige a análise de múltiplos e complexos elementos que resultará na concepção do melhor projeto para o cliente. Este é o trabalho do especialista.

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Gilmar

Mestre em Ecologia Humana e Problemas Sociais Contemporâneos pela Universidade Nova de Lisboa, Pós-graduado em Educação Ambiental, em Gestão Ambiental e Sanitária e Técnico em Meio Ambiente. É consultor especialista em biogás.

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O potencial do biogás